domingo, 25 de novembro de 2012

Fórum Fantástico 2012: Mergulhar na ficção




Neste fim-de-semana, de 23 a 25 de Novembro, a Biblioteca Orlando Ribeiro em Telheiras abriu as portas à sétima edição do Fórum Fantástico. Este é um evento em expansão que procura dinamizar o culto da literatura de ficção e o imaginário dos leitores.
O Fórum de este ano teve uma programação diversificada com workshops de Escrita Criativa Fantástica e visualizações de curtas-metragens para além das palestras e debates habituais com escritores do género e aspirantes a sê-lo. Paralelamente ao evento, estava a decorrer exposição temática e uma loja de livros e jogos temáticos. Só pude assistir às sessões da tarde de dia 24, que irei partilhar convosco.
A tarde de sábado foi dedicada ao lançamento de não uma mas três revistas do género: a Trëma, a Lusitânia e o Almanaque Steampunk. No caso das duas primeiras, ambas procuram divulgar o género fantástico em Portugal exclusivamente através da publicação de contos. Funcionam como um veículo onde qualquer um pode fazer parte da comunidade enviando uma história que, depois de um processo de selecção, poderá ser publicada na revista.
Na apresentação da Trëma, de Rogério Ribeiro, apercebi-me imediatamente da heterogeneidade dos autores; pessoas, de idades, géneros e percursos diferentes; que habitam nas páginas da edição. Entre os autores estavam presentes uma rapariga jovem, uma mãe que se aventurava nessas andanças e ainda um homem nos seus cinquenta anos com ligações à Engenharia Electrotécnica. Este último contou brevemente a sua história sobre um homem que surfava pelo espaço, com fundamentos científicos por detrás da narrativa. Em comum a todos eles estava a paixão pelo fantástico e defenderam-no orgulhosamente com algum humor à mistura.
Em seguida surgiu a Lusitânia pelo comando de Carlos Silva e da sua equipa. A apresentação desta jovem revista foi dinâmica, onde os editores procuraram explicar a lacuna de algo do género em Portugal. Trata-se de uma revista que valoriza histórias assombrosas com origens na História e locais do nosso país. É, portanto, uma revista que claramente homenageia a marca nacional acabando por ter, indirectamente, também uma componente didáctica. Essencialmente procuram-se lobisomens, bruxas, espíritos e extraterrestres com sangue luso. Os editores demonstraram prazer pelo projecto e prometeram dar seguimento à revista, afirmando que só o poderiam fazer com a contribuição de quem estava do outro lado, a quem apelaram.
Por fim, em palco apresentou-se a equipa Clockwork Portugal, criadores do Almanaque SteamPunk. Na mesa, a designer Joana Maltez e o seu grupo lançaram algumas linhas acerca do que é o culto SteamPunk, algo que ainda está a emergir em Portugal, assim como o evento EuroSteam Con que ocorreu no final de Setembro no Porto. Resumindo, o steampunk é um movimento que se baseia nas vestes do período vitoriano e nas máquinas e engrenagens da revolução industrial do início do século XX. O steampunk transcende o aspecto visual, uma vez que, segundo a Clockwork Portugal, “é um fenómeno que valoriza a ligação entre a humanidade, a ciência e a evolução das sociedades”.
Foi precisamente esse interesse pelo tema que fez com que um grupo de pessoas se juntasse e a criasse a comunidade Clockwork em Portugal, algo que já existia no Brasil. O EuroSteam Con foi um evento que surgiu desse mesmo suor e, passado algum tempo, serviu não só para divulgar o culto mas também para servir como portal para fomentar a ficção literária. Das mãos da Clockwork surgiu o Almanaque Steampunk, na sua primeira edição, que em termos de aspecto lembra-nos as revistas de divulgação geral de outros tempos ou mesmo as clássicas Borda d’Água. Tal como as outras revistas, o Almanaque está aberto aos textos de qualquer um e procura encher as suas páginas não só com contos mas também com crónicas, artigos, entrevistas e jogos.
Decorridas as sessões de lançamento, as pessoas apressaram-se a sair e colocar a conversa em dia para além de adquirir os primeiros exemplares das obras. Jovens escritores, editores ou mesmo fãs juntaram-se para trocar ideias e contarem as suas inspirações e prazeres na escrita. Na verdade, os três grupos das revistas já se conheciam e, apesar de terem projectos diferentes, não perdem uma oportunidade para debater os temas de que tanto gostam. Mais do que um evento literário por si só, o Fórum é um evento onde se desenvolvem amizades e inspirações para as veias criativas de todos.
Antes de sair, ainda pude assistir a uma palestra sobre mitos e fantasmas na ficção nacional e à exibição de “Conto do Vento”, a curta-metragem premiada de Cláudio Jordão e Nélson Martins, que brilhou pela ligação entre o elemento visual e a narrativa. Falou-se também nas dificuldades em implementar ideias de ficção a nível audiovisual e lançou-se um voto para as pessoas não deixarem de sonhar, de criar algo para além da realidade do quotidiano. No fundo é essa a ideia do Fórum Fantástico: de levar mais pessoas a ler e a criar mundos para além do mundo. Para o ano há mais.


O grupo da revista Trëma
O grupo da revista Lusitânia
O grupo ClockWork Portugal e do Almanaque SteamPunk
Painel “Mitos e Fantasias na Ficção Nacional”

domingo, 2 de setembro de 2012

Análise: Concerto de Jack White


Jack White, o fundador da banda de culto White Stripes, apresentou-se em nome próprio no dia 31 de Agosto no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, para uma noite de puro rock. A abertura coube aos The Poppers, uma banda portuguesa em ascensão.
O Coliseu esteve cheio numa noite quente que prometia. Após as portas abrirem ouviram-se logo os primeiros sons mexidos dos The Poppers. A música deles dificilmente deixaria alguém indiferente. Numa mistura entre o género country americano e o rock mais alternativo, as faixas convidavam aos abanões ou ao moche. Contudo, a multidão não demonstrou mais do que uns quantos esbracejos e cabeças a anuir. A banda passou no exame mas o que que todos queriam ainda estava nos bastidores.
Surgiu o intervalo e as massas deslocaram-se para melhor ver, tocar e sonhar com a banda de Jack. Não havia uma idade fixa, avistando-se pessoas dos 15 aos 50 por entre as bancadas. Pessoas que vinham, quiçá, por curiosidade ou culpa inconsciente de ter perdido a última vinda de Jack à capital. Foi só há cinco anos mas para muitos foi uma eternidade. O fenómeno White Stripes ainda perdura nos ouvidos e corações de todos.
Eis que sobe alguém ao palco. É um membro da banda que pede à multidão para assistir ao concerto com os telemóveis e câmaras desligados. E tem toda a razão. Para mim, os concertos mais memoráveis valem bem a pena ser vistos com os próprios olhos. O público esperou muito pouco, não tardou até as luzes se apagarem e Jack e a sua banda aparecerem sob um foco de luz azul. Com um ar aparentemente neutro, surgiram os primeiros acordes de Dead Leaves and the Dirty Ground, uma canção dos White Stripes.
De facto, todo o concerto foi um brinde de nostalgia aos mais aficionados. Foram tocadas 22 músicas sendo que metade delas pertenceram a projectos passados do guitarrista. Surgiram temas clássicos como Top Yourself, dos The Raconteurs, I Cut Like  Buffalo dos The Dead Weather e The Hardest Button to Button dos White Stripes misturados com mais recentes, como a balada Love Interruption ou o mais animado Sixteen Saltines.
A neutralidade inicial de Jack desvaneceu-se uns minutos depois. No palco viu-se o guitarrista bem disposto interagindo com os outros membros e alternando entre a guitarra e o piano, mostrando a sua versatilidade de artista. Sublinho também a energia de Daru Jones, o baterista que, por vezes, parecia que estava isolado no seu mundo, surpreendendo com o seu talento e intensidade em várias ocasiões durante o espectáculo.
O concerto durou duas horas e terminou com um encore, começando com Steady As She Goes e fechando com a clássica Seven Nation Army. Esta última música era a mais esperada como o demonstraram os fortes bateres de pés nas bancadas de toda a audiência. Ninguém ficou indiferente, todos entoaram o hino de Jack até ao último fôlego. Se Jack White regressará em breve ninguém o sabe. De qualquer modo ele provou, mais uma vez, que é mais do que um rótulo, é um fenómeno por si só.

sábado, 1 de setembro de 2012

Crítica: Uma Viagem à Índia



Muito aclamado pela crítica como um livro intemporal e revelação dos últimos tempos, a Viagem à Índia de Gonçalo M. Tavares lembra-nos "Os Lusíadas" de Luís Camões pela sua construção em estrofe e aparente alusão à ode heróica. Basta ler as primeiras páginas para nos apercebemos de que o que temos em mãos não é bem a mesma coisa.
"Uma Viagem à Índia" é um trabalho de reflexão do autor acerca de tudo o que o rodeia e experienciou ao longo da vida. A viagem de Bloom é o tema principal do livro que acaba por passar para segundo plano em várias ocasiões. Bloom parte de Portugal com o objectivo de encontrar a sabedoria na Índia. Pelo caminho faz escalas curtas em Londres, Paris e Praga. Sublinho aqui a excelente capacidade do autor em pintar-nos uma imagem brilhante das pessoas e dos seus hábitos em cada país.
Após algumas peripécias, Bloom chega à Índia onde irá ter uma descoberta pessoal. Sem querer entrar em revelações, devo confessar que me surpreendeu a construção caótica da escrita e raciocínio do autor no último capítulo do livro.
Recomendo-o vivamente pois acaba por ser especial quer pela sua construção a lembrar "Os Lusíadas", quer pela própria epopeia de Bloom. Gonçalo M. Tavares usa esta obra para expôr algumas das suas visões acerca do mundo que o rodeia, se bem que por vezes de forma pouco clara.

Autor: Gonçalo M. Tavares
Ano: 2010
Páginas: 484
Editora: Editorial Caminho

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Menos por mais


Pude assistir há pouco a uma reportagem de um canal privado onde se abordou o facto de cada vez mais portugueses viverem com o ordenado mínimo. Durante a peça foi entrevistado um jovem, cujo nome não me recordo, que está nessa situação. Irei chamar-lhe de “João”.
O “João” tem 26 anos e licenciou-se em Marketing. Actualmente trabalha num call center e recebe o ordenado mínimo. No entanto, ele diz que é possível viver e ser independente mesmo estando nessa situação. O “João” tem sonhos, como muitos outros, e acredita que os poderá realizar… mas não neste momento. Apesar de tudo o “João” não deixa de sonhar e de acreditar.
Afastemo-nos um pouco do futuro por uns instantes e centremo-nos no presente do “João”. Ele utiliza os transportes públicos, não vai ao cinema, evita viajar e são raros os dias em que janta fora. Aquilo que à primeira vista poderá parecer uma infelicidade para alguns acaba por ser a expressão carrancuda de outros de idade mais avançada.
Verdade seja dita, hoje em dia temos a sorte de viver numa época onde estamos cada vez mais próximos uns dos outros à distância de uma mensagem de texto, de um clique ou de uma viagem de baixo custo. Falo de um período onde a esperança média de vida está acima dos 60 anos e onde podemos adquirir refeições feitas em menos de cinco minutos.
Para além disso vivemos num mundo de licenciados, mestres e doutores. Falo de uma sociedade onde as pessoas têm a oportunidade de irem para a universidade para prosseguirem nos seus estudos apesar da subida do preço das propinas. Temos telemóveis, computadores portáteis e televisões com mais canais do que aqueles que nos interessam.
É por todas essas razões e mais algumas que sou da opinião que habituámo-nos a ter demasiado e a dar pouco valor ao que temos. É precisamente esse “demasia” já enraizada no crescimento de muitos que conduz a estados de depressão por não se poder cometer os excessos. Falo aqui das viagens, dos cinemas, dos jantares ou saídas em discotecas da moda. São bens materiais mas não essenciais.
Perguntará então o leitor: mas então quais serão esses bens essenciais? São os bens imateriais. Falo de sentimentos como o amor, o carinho, o respeito, o afecto. Dizem que uma época de crise é sinónimo de oportunidade, de empreendedorismo… não quero ir por aí. Creio que, acima de tudo, é um período onde podemos aprender a olhar em nosso redor e apercebermo-nos de certos valores e do que realmente interessa.
Creio que esta crise será vencida com paciência e muita entreajuda entre todos. Chegou a altura de deixarmos de olhar para o nosso umbigo e pensar em como poderemos ser úteis para o próximo. Cada um de nós é único e especial à sua maneira mas muitos não se apercebem disso. Tal como no amor onde a nossa cara-metade poderá estar a um palmo de distância e não nos apercebemos, também nós temos o hábito de ignorar as nossas capacidades e a nossa rede de contactos que se torna cada vez mais acessível.
Para concluir, acho que a crise será superada mais facilmente assim que nos apercebermos do valor real do que temos à nossa volta e de repensarmos as nossas atitudes. É certo que o “João” tem um curso superior e sonha alto, ninguém o impede de o fazer. Apenas aprendeu a adaptar-se às circunstâncias e quiçá a lembra-se das pequenas coisas, das que realmente contam.  

segunda-feira, 11 de junho de 2012

O delírio pelo esférico e a febre do nacionalismo


Entrámos em Junho e com ele chegou a febre do desporto a céu aberto. Este é o mês do Europeu de futebol, do torneio de ténis Roland Garros em França e de outros eventos recorrentes como o MotoGP para os aficionados pelos motores. Vou-me centrar no fenómeno do futebol e da imagem da nossa selecção nacional.
Ser jogador de futebol de um clube reconhecido internacionalmente é sinónimo de carros de luxo, de hotéis caros, de brincos e de cabelos eriçados. Claro que, como tudo na vida, para se chegar à glória é preciso verter muito suor. Ser jogador de uma selecção nacional é suportar um peso dez vezes superior, é levantar toda uma nação. Quando as selecções jogam o duelo acaba por ser muito mais do que apenas uma troca de jogadas e fintas, é um embate de duas bandeiras e de sistemas económicos que visto de fora nos telejornais pode equivaler à história de David contra Golias.
Foi precisamente essa história que se mostrou no passado sábado, na Ucrânia, quando Portugal defrontou a Alemanha no primeiro jogo do seu agrupamento. Não é que a selecção portuguesa seja tão desproporcional frente aos seus vizinhos germânicos, mas a verdade é que grande parte da população portuguesa ergueu os punhos na esperança de superar o país de Angela Merkel através de uma boa goleada no marcador… o que infelizmente não aconteceu.
O problema aqui não é a qualidade dos jogadores, eles fazem o seu melhor. Sou da opinião que a ferida vem mesmo do cerco mediático exagerado que se colocou antes e durante a participação da selecção no Euro. Há quem acredite que se investe demasiado na cobertura do evento, dinheiro esse que sai do bolso da população e poderia ser utilizado para fins mais úteis. No entanto, não é por aí que quero chegar. O que critico é o exagero desmesurado que se faz pela parte de certos canais para relatar ao pormenor a vida e o treino dos jogadores durante o evento.
É certo que vivemos num mundo globalizado onde a informação vem ter connosco num ápice mas até que ponto é que passamos da informação para o trivial? É uma barreira ténue e no caso da cobertura à equipa da selecção foi rompida nos primeiros minutos de esses programas. É simpático para o fã poder sentir-se próximo dos seus ídolos, mas será realmente interessante saber o que é que o Coentrão almoçou ou que a que horas é que o Ronaldo saiu do duche?
O espectáculo mediático continua nos anúncios. Grandes marcas procuram usar a selecção também como uma via para promover-se indirectamente. Assistimos então a promoções para piqueniques, corridas pela selecção, pacotes especiais nos bancos e afins. Não é que eu critique o facto de se fazerem em si, até porque alegra-me ver uma nação unida por uma causa, mas ficaria mais feliz se fosse por algo mais nobre como uma recolha de alimentos ou da Cruz Vermelha. Regressemos então ao peso nos ombros dos nossos jogadores…
A selecção de Paulo Bento tem uma responsabilidade maior do que aparenta, tem a missão de fazer lembrar à Europa e ao mundo que o país é melhor do que a avaliação que as agências de rating lhe deram. O problema é que com um cerco mediático tão exagerado a esperança ultrapassa os níveis do racional para o cegamente fantasioso. Sou da opinião que talvez uma menor cobertura não tão directa aos jogadores poderá ajudar a acalmar os nervos e a melhorar o seu desempenho. Eles já são o centro das atenções quer queiram, quer não e não é necessário apontar-lhes uma câmara vinte e quatro horas por dia a lembrar a teoria de Orwell que irá facilitar as coisas.
Para concluir, não posso deixar de referir a minha opinião em relação ao desempenho da selecção nos últimos jogos. Acho que Portugal não jogou tão bem quanto eu esperava mas como português espero sinceramente que ainda nos traga uma bela surpresa. Encaro o Euro como uma competição entre grandes selecções onde os melhores dos melhores se defrontam. É um evento único e de forte atenção dos fanáticos aos curiosos. É por isso que acredito que algum afastamento dos fanatismos provocados pelos media poderá ajudar a aguçar a visão crítica do que acontece nos diferentes relvados. Estarei atento à Espanha, à Alemanha, à Inglaterra, à Itália… enfim, grandes colossos que irão surpreender. E mesmo que Portugal perca aconselho a não perderem de olho os nossos colegas europeus… Resta só dizer: que ganhe o melhor! 

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Crítica: Spaced



“Dizem que a família do século XXI é composta por amigos e não familiares… ou então é tudo uma treta.” Esta é a expressão que se ouve no último episódio de Spaced, uma série da autoria dos britânicos Simon Pegg e Jessica Stevenson. A série é composta por duas temporadas e conta a história de dois conhecidos que são obrigados a fingir que são um casal para viverem no seu apartamento de sonho.
O enredo é relativamente simples: Tim (Pegg) acaba de terminar uma relação e está à procura de casa própria mas sem sucesso. Assim que chega a um café encontra Daisy (Stevenson) que vive num apartamento cheio de gente e mal vê a hora de sair de lá para ter o seu espaço próprio. Rapidamente trocam conversas e, ao longo de vários dias, simpatizam cada vez mais um com o outro. Subitamente surge um anúncio de um apartamento ideal para ambos mas só existe um inconveniente: o anúncio destina-se a um casal.
Tim e Daisy procuram descobrir o essencial acerca de cada um e conseguem enganar a senhoria que estão realmente juntos. A partir de esta fase descobrimos como é que eles realmente são enquanto assistimos aos seus conflitos. Tim trabalha numa loja de banda desenhada e os seus interesses resumem-se a coleccionar figuras de animação e a jogar na consola. Daisy está desempregada e sonha ser uma escritora de renome. É difícil não esboçar um sorriso enquanto assistimos às tropelias entre ambos enquanto se ajudam e discutem sobre o olho atento da senhoria.
Spaced não se centra só nestes personagens. À medida que o enredo se desenrola vai-se formando um grupo de amigos habitual na companhia de Brian, o vizinho do rés-do-chão que é um artista conceptual, Twist, a melhor amiga de Daisy e uma designer com um comportamento explosivo, e Mike, o melhor amigo de Tim que está no exército e vive completamente obcecado com armas. O grupo acaba por ficar com um sétimo elemento mais para a frente.
A série está repleta de referências à cultura pop do cinema e dos videojogos. Tim é um fã devoto da Guerra das Estrelas e numa determinada altura acaba por ser demitido de uma maneira hilariante por odiar os primeiros filmes. Spaced não se centra na cultura pop mas ela encontra-se camuflada no enredo de maneira discreta e imprevisível. Assim que começa o episódio já sabemos que iremos ser bombardeados com pelo menos dez referências nostálgicas tanto pelo diálogo como pelas acções ou a roupa dos personagens.
Spaced é uma série sobre laços de amizade. Apesar de se centrar no género da comédia, muitas vezes situacional, consegue ter os seus momentos sérios. Nota-se que houve um trabalho intenso da parte de Pegg e de Stevenson para talhar perfeitamente a caracterização de cada personagem. Não é de admirar que Stevenson tenha sido premiada por duas vezes com um British Comedy Award para melhor actriz numa comédia. Esta é uma série que merece ser vista pelo menos uma vez na vida, especialmente para quem é fã de cinema e/ou animação. 

Título original: Spaced
Realizador: Simon Pegg, Jessica Stevenson
Elenco: Simon Pegg, Jessica Stevenson, Nick Frost, Mark Heap, Julian Deakin, Katy Carmichael
Ano de estreia: 1999
Género: Comédia

terça-feira, 3 de abril de 2012

Crítica: O Náufrago


O Náufrago é um filme com a assinatura de Robert Zemeckis, conhecido pela trilogia de Regresso ao Futuro. A obra, apesar de ter um enredo simples, tem o efeito de colocar o espetador a pensar acerca da sua própria existência e do valor que pode dar às suas condições de vida.
O filme conta a história de Chuck Noland (Tom Hanks), um funcionário da rede de entrega de mercadorias FedEx. Chuck é completamente obcecado com o tempo, vivendo e respirando para o seu ofício, acabando por negligenciar a relação que tem com Kelly, a sua namorada (Helen Hunt). A vida de Chuck sofre uma reviravolta quando o avião em que viaja é apanhado numa violenta tempestade e despenha-se perto de uma ilha algures no oceano Pacífico… sendo ele o único sobrevivente.
É irónico que o homem para quem cada segundo contava tinha agora todo o tempo do mundo. Chuck perdeu o sinalizador do barco salva vidas e encontrava-se agora isolado numa ilha deserta contando apenas com as suas roupas e alguns caixotes da FedEx que vieram dar à costa. Ele abre todas as embalagens excepto uma. O filme é claramente uma versão moderna da história de Robinson Crusoé. A partir de este momento o enredo centra-se na adaptação da personagem às condições mais básicas de vida sem qualquer acesso à electricidade ou à tecnologia.
Chuck representa qualquer um de nós e como agiríamos se nos encontrássemos em tal desaire. É curioso ver o progresso que a personagem faz ao longo dos meses desde o esforço que demonstra para abrir um côco até descobrir como fazer fogo para se aquecer. A única amizade que Chuck faz durante o seu isolamento é com uma bola de voleibol à qual chamou de Wilson. O objecto serve como o seu companheiro inanimado para quebrar o isolamento que sente.
Passados quatro anos, encontramos Chuck sob uma forma completamente radical. Tem cabelos longos e grisalhos, está mais magro, mas as suas habilidades e técnicas físicas estão mais apuradas que nunca. Após ter desaguado na praia parte de uma casa de banho portátil ele nem pensa duas vezes. Chuck mostra a sua mestria terminando a construção de uma jangada sólida usando a cobertura da casa de banho como vela. Mal termina o projeto, lança-se ao mar contando apenas com a “companhia” de Wilson… e consegue escapar da ilha.
O caminho de regresso foi duro, acabando por perder o seu “companheiro” no meio de outra tempestade. De sublinhar a reação de desespero de Chuck quando perde o seu amigo, voltando a sentir-se só... Felizmente, acaba por ser resgatado por um cargueiro e trazido de volta para os Estados Unidos, o país que o tinha dado como morto.
Contudo, a visão de Chuck mudou, ele não quer ser um herói, apenas anseia rever a sua amada. O momento do reencontro é adiado e ele apercebe-se que a situação já não é a mesma. Kelly constituiu família com outra pessoa e tem uma filha. A paixão de ambos ainda persiste mas sabem que é impossível continuar sem prejudicar o seu núcleo familiar.
Na reta final encontramos Chuck preocupado em devolver a embalagem da FedEx que trouxe da ilha e nunca chegou a abrir. Quando chega à morada encontra a casa vazia então conduz até a uma encruzilhada. Está sozinho e o único som vem de um camião conduzido por uma mulher. Após perguntar-lhe as direções, descobre que essa pessoa mora na casa que acabou de deixar. O filme termina com ele a olhar para esse caminho enquanto sorri e liga o motor.
A obra transmite-nos uma mensagem de persistência. Mostra-nos que com paciência conseguimos fazer coisas que nunca pensámos ser capazes de fazer. O filme chega a ser parado nalguns momentos mas creio que isso chega a ser essencial para nos associarmos à situação da personagem. Isto porque nunca se sabe como será o dia seguinte.

Título original: Cast Away
Realizador: Robert Zemeckis
Elenco: Tom Hanks e Helen Hunt
Ano de estreia: 2000
Género: Aventura/Drama

domingo, 11 de março de 2012

Crítica: Vergonha


Vergonha é uma obra mais complexa do que parece. O drama, do realizador Steve McQueen, conta a história de Brandon Sullivan (Michael Fassbender), um indivíduo viciado em sexo cuja vida leva uma reviravolta com a chegada da sua irmã (Carey Mulligan).
Brandon é um homem de meia idade, bem sucedido e pouco emotivo. Na primeira parte do filme é-nos apresentado o seu dia-a-dia, que consiste em pagar a prostitutas para ter relações no seu apartamento. Não tarda muito até o espectador começar a aperceber-se de quão grave é o estado de Brandon: ele mal consegue manter uma conversa casual, passa as noites isolado a ver vídeos eróticos e rejeita por completo o amor… porque não o conhece realmente.
A personagem é como uma marioneta, um corpo movido para satisfazer as suas necessidades primárias sem qualquer interesse por qualquer tema que não envolva o seu prazer físico. Não é que Brandon seja tímido, simplesmente vive numa bolha irreal, num mundo pequeno onde é ele que dita as regras e faz o que lhe apetece, quando quer. A vida de Brandon é alterada com a chegada de Sissy, a sua irmã.
Sissy “aterra” literalmente sem avisar no seu pequeno mundo. A irmã mais nova não faz a menor ideia dos vícios do irmão e sempre estranhou o seu isolamento forçado. Não é que ele a odeie, é simplesmente um efeito do estado grave da sua doença. Sissy sonha com uma carreira musical e também é um pouco desajustada socialmente. No entanto, ela adora o irmão procurando obter o seu afecto por muito que ele tente afastar-se de tudo e de todos.
Um dos pontos fortes do filme é certamente o desempenho dos actores e o modo como interagem entre si. É curioso assistirmos a uma cena de jantar onde se encontram Brandon e outros convidados para nos percebermos do contraste que existe entre eles. A personagem limita-se a sorrir e a anuir mas no fundo o que vemos é um corpo oco, sem interesses, um predador de instintos primários que ainda não encontrou a cura.
Vergonha é um filme que poderá conter alguma polémica e não agradar a alguns grupos mas não deixa de ser altamente recomendável. Steve McQueen explora o mundo privado de uma pessoa perfeitamente normal na sua vida profissional mas completamente vaga a nível emocional. Brandon é um corpo num filme onde corpos se revelam e existe um forte jogo de emoções entre o espectador e as personagens.

Título original: Shame
Realizador: Steve McQueen
Elenco: Michael Fassbender e Carey Mulligan
Ano de estreia: 2011
Género: Drama

segunda-feira, 5 de março de 2012

O dilema do fumo e a vontade de crescer


Cada vez mais tenho reparado em crianças de cigarro em riste. Quando me refiro a crianças não se trata de um nome que reforça a minha diferença de idade: são mesmo crianças.
Nos meus passeios já é quase certo que, mal passe por uma escola secundária, encontro logo adolescentes a experimentar «o fruto proibido». Até aí consigo tolerar, mas a situação azeda quando vejo miúdos com pouco mais de dez anos de cigarro na mão. Serão as influências de terceiros? Serão vítimas de uma lavagem cerebral involuntária dos média?
Parece que as gerações seguintes crescem a uma velocidade estonteante. Mal saem do útero agarram-se ao biberão, que o descartam pelo café e o largam pelo cigarro. Têm tanta correria para crescer que nem desfrutam da infância. São «senhores» de palmo e meio sem qualquer tipo de responsabilidade.
No meio disto tudo qual será o papel dos pais? Infelizmente (ou felizmente) o dinheiro não cresce nas árvores, então tento perceber como nascem esses pequenos cilindros nas mãos de crianças de apenas doze anos.
Ver este tipo de situações só reforça a minha opinião que o problema do país está na Educação. Estou a falar da transmissão do saber pelos pais e não do ensino escolar. É um tema complexo porque é difícil para os pais conseguir evitar que os seus rebentos sejam corrompidos pelo exterior mas o seu papel é fulcral!
A esperança média de vida tem vindo a crescer nos últimos anos devido aos avanços na saúde e a mudanças de hábitos alimentares. No entanto, temo que possamos estar a criar uma geração movida a nicotina. Não vejo mal nenhum que uma pessoa adulta fume, pois já é responsável pelo seu destino, dói-me é ver crianças de cigarro em riste, seduzidas por sensações que procuram e que poderão levá-las à sua perdição… na mais completa ignorância.  

sexta-feira, 2 de março de 2012

Reportagem: "O Pó"


Está agora em cena “O Pó”, a mais recente peça da autoria de José Meireles encenada por Abílio Apolinário. A obra ganha vida pela Projéctor, a Companhia de Teatro do Barreiro, e vai estar em cena na Sociedade Instrução e Recreio Barreirense (SIRB) durante os dois primeiros fins de semana do mês de março.
A peça tem como base o tema da droga e de como a sua dependência pode trazer consequências nefastas para o indivíduo e os seus mais próximos. A história centra-se em "Jony" (Ricardo Gião), "Alex" (Tiago Soares) e "Jim" (André Antunes) que formaram uma banda mas que se deixaram atingir pela influência do pó. "Alex" e "Jim" já se encontram em fase de recuperação sendo que grande parte da descarga emocional recai sobre o terceiro elemento.
"Jony" é uma personagem mais complexa do que parece. Durante a peça o público assiste a alguns dos seus ensaios para a gravação do primeiro disco mas é nos intervalos que se apercebe da fragilidade da relação entre os três amigos. O que aparenta ser uma “unidade” está claramente dividida devido aos comportamentos irregulares de "Jony", cuja saúde física e mental se vai deteriorando ao longo da peça. "Alex" e "Jim" lutam arduamente para procurar restabelecer a união mas mesmo assim torna-se complicado pois mal conseguem manter a sua amizade.
Assistir a “O Pó” é como entrar numa locomotiva fumegante que nos conduz freneticamente até ao final. Durante 45 minutos assiste-se a uma sessão intensa de música e de diálogos pesados tendo como pano de fundo o rock n’ roll. O uso de videoclips durante os "ensaios" da banda permite uma maior aproximação com o público, misturando-se a ficção com a realidade.
Para Abílio Apolinário, “a peça procura servir como uma chamada de atenção para os mais novos acerca dos perigos da droga”. A introdução de personagens jovens poderá ajudar a facilitar esse elo de ligação. “Os jovens de hoje em dia estão dispostos a tudo e a utilização de linguagem pesada é essencial”, refere o encenador.
Ricardo Gião confessa que não consegue viver sem o teatro e procura explorar géneros dentro dos quais ainda tem pouca experiência. Esta é a sua quarta peça com a Projéctor e reforça que é mais fácil desempenhar papéis com amigos porque “já não existe a necessidade de adaptação e há um espírito de entreajuda, pois conhecemos as fraquezas uns dos outros”, afirma o ator.
Depois de “O Pó”, a Projéctor já está a preparar “Loucos de Amor” de Sam Shepard, a 27 de março e “Baal” de Berltont Brecht a 27 de outubro.


Local e horário das sessões:
Dias 3, 10, 16 e 17 pelas 21h30
Dias 4 e 11 pelas 17 horas
Sociedade Instrução e Recreio Barreirense (SIRB), “Os Penicheiros”
R. Almirante Reis, n.º 66, Barreiro
Telefone: 212 073 409   Email: penicheiros@portugalmail.pt
Website da Projéctor: http://projector-teatro.pt.vu

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Torres em Alta

Hoje fui visitar o Carnaval de Torres Vedras. Já é a segunda vez que vou a esta festa, que é por muitos considerado como «o Carnaval mais português do país», pelo que já posso fazer algumas comparações.
O centro da cidade de Torres Vedras enche-se de alegria durante seis dias com um desfile de carros alegóricos que procuram satirizar algumas das figuras públicas mais emblemáticas do país. Neste ano as personagens principais foram o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e outros políticos com alguma ação no estrangeiro como Paulo Portas e Durão Barroso. Também surgiram personagens ligadas ao mundo do futebol como Pinto da Costa, que ficou colocado num carro onde nem faltou Sá Pinto, o novo treinador do Sporting. Estranhamente não houve grandes referências a Cristiano Ronaldo, cuja cara apareceu muitas vezes no ano anterior muito por causa da polémica da altura acerca da mãe do seu filho.
Os carros alegóricos são acompanhados de grupos de crianças com temas de disfarce variados. Vi passar leões, lutadores de sumo, carrinhos e ainda, acreditem ou não, bandeiras de golfe. O grupo de que mais gostei estava disfarçado de pinos de bowling, onde cada um tinha um palavra no peito, como «ordenados», «trabalho» e «pensões». A mensagem a passar era clara: a bola do governo iria derrubá-los a todos e, quem sabe, o Zé Povinho é que os recolhia.  
A extinção da tolerância de ponto foi notória e pareceu-me haver uma menor afluência em relação ano anterior. Apesar disso, nada impediu pessoas de qualquer idade de mergulhar neste mundo de sátira e de vibrar com ritmos brasileiros pela tarde fora. Deixo-vos com algumas fotografias. Vejam se os conhecem.










sábado, 18 de fevereiro de 2012

A Vida Portuguesa

É engraçado como cada dia, se estivermos atentos, podemos encontrar novidades nos sítios mais conhecidos. Enquanto descia a rua Garrett em Lisboa, bem perto da livraria Bertrand, fiquei com curiosidade de ir explorar a rua Anchieta, onde estão habitualmente algumas bancadas de alfarrabistas. Qual foi o meu espanto quando descobri uma loja de venda de artigos portugueses do século passado chamada A Vida Portuguesa.
Já tinha ouvido falar da marca, mas nunca tinha entrado numa das suas lojas. Segundo as minhas pesquisas, a marca A Vida Portuguesa existe desde 2007 e foi fundada pela jornalista Catarina Portas. O conceito é interessante e procura trazer de volta todo o tipo de artigos que encontrávamos em casa dos nossos avós quando éramos pequenos.
Assim que coloquei os pés dentro da loja olhei para a direita e deparei-me com uma parede cheia de barras de sabão com todo o tipo de embalagens e feitios. Ao seu lado estava o creme e o pincel de barbear, acompanhados da pasta dentífrica Couto para o bom freguês. O meu olhar percorre então o resto do espaço e vejo todo o tipo de cartazes e postais a persuadir o turista a visitar as nossas belas praias… de há cinquenta anos atrás!
Sou dominado pela curiosidade e entro na próxima secção onde estão carrinhos de madeira, cordas e todo o tipo de jogos para as crianças de outra geração. Nas paredes estão cadernos clássicos com uma etiqueta para colocar o nome na frente, baralhos de cartas, andorinhas de cerâmica e ainda peças de ourivesaria para as senhoras. Entro na última sala, onde estão os alimentos de outrora. Aqui estavam as latas de sardinha, a farinha de arroz, o vinho tinto e o clássico licor Beirão.
Para mim, o sucesso da Vida Portuguesa reside não no que vende, mas como o vende. Ao ressuscitar marcas e cartazes de outro tempo, consegue despertar tanto a curiosidade das novas gerações como a nostalgia dos mais veteranos. É um verdadeiro museu português despercebido em plena Baixa lisboeta.
Quando saí da loja ainda percorri a rua até ao fim para ver o que por lá havia e não me arrependi. Mesmo na esquina, encontrei um café temático. Chama-se Kaffeehaus e foi fundado por austríacos. Da vitrina da loja observei que tinha um ambiente acolhedor com sofás aconchegantes e posters de filmes antigos. Cheira-me que poderá vir a ser a minha futura paragem!

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

As Catedrais do Saber

Desta vez irei descrever um local que tenho andado a visitar por obrigações académicas: a biblioteca. É curioso porque se pudesse recuar há uns anos jamais me imaginaria a escrever sobre isto.
Desde que voltei a estudar fui forçado a ser auto-didacta. As bibliotecas têm sido desde então o meu segundo lar e uma fonte de fascínio. Agrada-me imenso percorrer as suas salas e observar as longas estantes que se estendem até ao tecto. Maravilho-me com as etiquetas que se referem às mais variadas áreas do conhecimento: Psicologia, Sociologia, Jornalismo, Gestão... tantos mundos à espera de serem descobertos, tantos livros já partilhados e que anseiam sair para o mundo uma vez mais.
Há uns anos não conhecia o valor do silêncio. O facto de estar presente nesses espaços fazia-me sentir formigueiros, queria a luz do Sol e os meus ouvidos pediam a música do mp3, o meu nirvana pessoal. Hoje, sou capaz de passar horas e horas por entre páginas de livros abertos.
Mas engane-se quem pensa que as bibliotecas estão isentas de ruído: é curioso ouvir as conversas ocasionais, as gargalhadas dos grupos de colegas que se juntam para discutir trabalhos de grupo e o «shhh...» dos leitores mais dedicados que por momentos sentiram um furo na sua bolha, no seu mundo.
Isto porque os livros são mundos dentro de mundos. Abres um e és brindado com todo o tipo de locais e personagens que te podem influenciar e trazer algo de novo à tua vida. Sentes-te no seu mundo. Tu próprio és o personagem que percorre corredores e estradas, páginas e páginas até chegar ao «Fim».
Para além de aventuras, os livros transmitem saber. Estão lá para qualquer leitor e são o seu companheiro fiel nas noitadas de estudo. Estão sempre disponíveis para auxiliar a passar aquele exame mais difícil e o trabalho que já devia ter sido entregue no dia anterior. Também são rebeldes pois deixam-se tatuar com linhas de carvão e o rabisco ocasional, mensagens que passam para a posteridade e que tornam cada um realmente único.
A crise não parece existir nas bibliotecas. Podemos sair de lá com uma mão cheia de livros e de sabedoria. Estes são usados e reutilizados e despertam a vontade de adquirir os seus «sócias» se a história for convincente. Mas estes livros são passageiros de curta duração. Tal como nós, adoram a sensação de regressar a casa após uma viagem... até serem escolhidos de novo.
É por isso que aprendi a valorizar as bibliotecas. Para além de serem um portal para o conhecimento gratuito, algumas chegam mesmo a ter palestras e eventos com convidados conhecidos que também se prontificam a partilhar as suas experiências. De pequenos a graúdos, sejam estudantes ou trabalhadores, há sempre tempo para um bom livro, uma boa história sob os seus tectos. Boas leituras!

domingo, 8 de janeiro de 2012

Recordar é viver

Segundo um estudo feito em Inglaterra e divulgado no Público, a mente humana começa a deteriorar-se apartir dos 45 anos. Ler isto serviu-me de motivação para começar a escrever acerca de um tema que já há uns tempos queria abordar: a memória.
Ao longo da vida vamos acumulando imensas experiências e histórias com as quais aprendemos. É uma colecção de erros que superamos e vitórias das quais nos orgulhamos. São aqueles momentos dos quais nos lembramos nos transportes públicos e não deixamos de esboçar um sorriso. É a nossa vida a vir ao de cima em constante rotação. São as nossas memórias.
As memórias consistem, a nível prático, em tudo o que aprendemos ao longo da vida desde o nosso primeiro suspiro. Permitem-nos progredir na vida académica e profissional. São aquilo que faz com que possamos ter uma conversa coerente com alguém tendo como base os nossos conhecimentos. Poderão ser aquilo que nos permite apresentar razões válidas para justificar um ponto de vista ou escrever uma crítica. É ver para crer e lembrar para escrever.
As memórias não têm preço. Dão valor a qualquer coisa mesmo a mais insignificante. Valor que também pode ser imposto aos outros. O preço de um DVD vale o que uma cadeia de lojas lhe dá mas poderá descer para metade uns meses mais tarde. É um valor que compramos e que nos foi imposto. Porém, e já que mencionamos o perda de valor, um livro com páginas amarelas e de aspecto gasto poderá parecer «lixo» para uns e valer ouro para um coleccionador ávido.
Os objectos não passam de objectos. É o valor induzido ou que lhes atribuímos que lhes dá valor. Isso tanto é aplicável à 'mega-edição-de-luxo-com-extras' de um DVD como aos retratos de família que se encontram pela nossa casa. São memórias, lembram-nos histórias e essas sim, não têm preço.
E isso traz-me de volta à razão deste texto: a perda de memória. A notícia é grave pois, segundo o estudo, a população está a perder a memória cada vez mais cedo. Assusta-me imenso pensar que daqui a uns 20 ou 30 anos, tudo aquilo que fizemos, todos aqueles que conhecemos, poderão tornar-se sombras, poderão desaparecer no vazio. Nascemos com nada e morreremos sem nada.
Gosto de acreditar que um dia, quando esse dia chegar, possa recuar todos os anos percorridos e lembrar-me de tudo, de todos e de todas as peripécias, das mais nobres às mais hilariantes. Não sei se a escrita ajuda, mas se assim for, espero não perder o pouco hábito que tenho de o fazer. Recordar é viver.